quarta-feira, 17 de março de 2010
Testamento de um cão.
"Minhas posses materiais são poucas e:
Deixo para você. Uma coleira mastigada em uma das extremidades, faltando dois botões, uma desajeitada cama de cachorro e uma vasilha de água que se encontra rachada na borda.
Deixo para você a metade de uma bola de borracha, uma boneca rasgada que você vai encontrar debaixo da geladeira, um ratinho de borracha sem apito que está debaixo do fogão da cozinha e uma porção de ossos enterrados no canteiro de rosas e sob o assoalho da minha casinha. Além disso, eu deixo para você a memória, que, aliás, são muitas.
Deixo para você a memória de dois enormes e meigos olhos cor de mel, de um nariz molhado e de choradeiras atrás da porta.
Deixo para você uma mancha no tapete da sala de estar junto à janela, quando nas tardes de inverno eu me apropriava daquele lugar, como se fosse meu, e me enrolava feito uma bolinha para pegar um pouco de sol.
Deixo para você um tapete esfarrapado em frente de sua cadeira preferida, o qual nunca foi consertado com o tipo de linha certo… Isso é verdade. Eu o mastiguei todinho, quando ainda tinha cinco meses de idade, lembra-se?
Deixo para você as memórias da primeira surra que levei quando comi seu celular e também todo o meu esquecimento…
Deixo para você um esconderijo que fiz no jardim debaixo dos arbustos perto da varanda da frente, onde eu costumava me esconder do sol nos dias de verão. Ele deve estar cheio de folhas agora e por isso talvez você tenha dificuldades em encontrá-lo. Sinto muito!
Deixo também só para você, o barulho que eu fazia ao sair correndo sobre as folhas de abril, quando vagabundeávamos pelo sítio.
Deixo ainda, a lembrança de momentos pelas manhãs, quando saíamos junto pela margem das lagoas do condomínio e você me dava aqueles biscrocks coloridos. Recordo-me das suas risadas, porque eu não consegui alcançar aquele coelho impertinente.
Deixo-lhe como herança minha devoção, minha simpatia, meu apoio quando as coisas não andavam bem, meus latidos quando você levantava a voz aborrecida… E minha frustração por você ter ralhado comigo todas as vezes que eu colocava o nariz debaixo da cauda.
Eu nunca fui à igreja, nunca escutei um sermão, e sem ter dito sequer uma palavra em minha vida, deixo para você lições de paciência, de tolerância, de amor e compreensão.
Sua vida tem sido mais rica porque eu vivi."
Frank Reinshstein
Lindo me faz chorar sempre que leio.
Essa cadelinha da foto é a Pequena, pegamos na rua atropelada cuidamos (colocamos pino na perna) e um dia de descuido ela fugiu e acabou sendo atropelada novamente, mas dessa vez sem sorte e veio a falecer.
Deixou saudades...
Ale
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